domingo, 26 de janeiro de 2014

Dupla Perseguição - Capítulo 2


               

            Não dava pra dizer que Rachel escapar da prisão era uma surpresa. Ela praticamente tinha alardeado que não ficaria por lá muito tempo. E também não era assim tão difícil, eu mesmo saí uma vez. Agora teríamos de identificar como ela conseguiu e tentar recapturá-la. Disse para Peter que não desejava participar daquilo. Queria me afastar do caso. Ele negou. Para Peter eu precisava ver o quanto aquela criminosa podia ser ardilosa. Parecia que ela continuaria na minha vida por muito tempo.

            Ela não fugiu exatamente do presídio...mas sim do hospital para onde novamente havia sido levada após novo mal estar. A informação era de que ela foi atendida na enfermaria e que, ao retornar, conseguindo abrir as algemas, rendeu os guardas ao roubar uma arma de choque! Deixou-os desacordados num terreno abandonado e seguiu de carro por cerca de 200 km, largando-o e, provavelmente acessando ao metro. Depois disso não se tinha ideia do que fez.

            - Voto de confiança? – Peter provocou.

            - Não dá para negar que ela é boa...o que?? Peter você tem que reconhecer! Ela deve pesar uns 50 quilos e venceu três guardas. É ruiva e conseguiu desaparecer. Ela merece um crédito.

            - Isso entra na cota do ‘você não está pronto para deixar a tornozeleira’! Vamos...temos que interrogar o pessoal do hospital. Ela não pode abrir uma algema tão fácil.

                                                                                          

            O ambiente claro, com cheiro de limpeza e silêncio perpétuo do hospital estava um pouco menos tranquilo do que de costume. Fazia tempo que o hospital recebia detentos e foram poucos na história a fugir daquela maneira. A chefe da enfermagem e a enfermeira que atendeu Rachel durante o curto tempo que permaneceu no ambulatório  falaram que não notaram nada de errado nela. Calada como da outra vez, ela chegou após mais uma crise de vômitos e uma queda de pressão.

            - É óbvio que tudo não passou de fingimento. Ela é muito boa nisso. Se for verdade que passou mal, deve ter forçado o vômito e fingido a queda de pressão! – Peter alardeou.

            - Agente Burk...com todo o respeito, quem tem anos de experiência num ambulatório sou eu e como enfermeira chefe desse hospital lhe afirmo que não houve farsa nos sintomas descritos na ficha da senhorita Rachel Turner nas duas vezes que esteve aqui. Inclusive, os exames nos esclareceram exatamente o que ela tem.

            - Como assim? O que ela tem? – Eu perguntei.

            - Essa informação foi dada a paciente. – Respondeu a mulher que não parecia gostar muito de policiais.

            - E logo depois ela fugiu! Eu quero uma cópia desses exames. – Peter exigiu.

            - Não será possível. É uma informação restrita, segundo o código de ética médica.

            - Ela é uma fugitiva da polícia!

            - Isso não a torna menos ser humano. Ela tem o direito de manter em sigilo a informação. E ela manifestou interesse de que não fosse divulgado para mais ninguém o resultado. Por isso, a menos que traga um mandado judicial, respeitarei o direito de minha paciente. – A enfermeira foi categórica.

            Essa história de ética média e ser humano foi muito estranha. O que Rachel tinha e por que desejava esconder? Não podia ser nada muito sério. Há poucos dias ela exalava saúde e beleza. O que poderia ser? Peter não gostou nada de ser desafiado assim, era uma características dos policiais. Eles não aceitavam que outras profissões também tinham regras. Já estava ao telefone solicitando o mandado judicial. Não entendi a razão do desespero. Nada ali nos ajudaria a encontrá-la. Era mais para provar para a enfermeira quem era mais forte.

            Depois disso aproveitamos para falar com os policiais. Ao que parece Rachel descarregou a arma de choque num nível altíssimo. Não seria o suficiente para matar, mas ela sabia que os deixaria desacordados por algum tempo. Em um deles usou uma potência mais forte e ainda lhe deu uma coronhada na cabeça. Roubou a camiseta e o casaco de um deles, além da arma e do carro. Ray, Carl e Mark já estavam recuperados. Os dois primeiros pareciam tranquilos quanto ao que ocorreu. Mark não. Ele estava com raiva e não escondia isso.

            - Já tem pista de onde ela está?

            - Não. Ela abandonou o carro e se misturou a população. Provavelmente pegou o Metrô. Não temos pistas.

            - Quando eu colocar a mão nessa vaca eu mato ela! Faço questão de descarregar uma arma de choque nela.

            - Acalme-se. Não vai por mão alguma nela. – Peter foi objetivo. - Nós vamos recapturá-la e ela retornará ao presídio para cumprir pena. Com o acréscimo de fuga e agressão a policiais.

            - É claro...- Não gostei da cara desse sujeito, muito menos do jeito nojento com que falava. – Mas não é o FBI que deve encontrar essa vadia. Você são da divisão de colarinho branco, não tem nada com isso. Nós, a polícia desse distrito, é que teremos a tarefa.

            - Ela foi presa por nós e é peça chave para um caso nosso. – Eu disse. Não...se esse cara iniciasse uma caçada contra Rachel, isso não terminaria bem. Estava na cara que ele não desejava apenas prender ela. – Nós vamos encontrá-la.

            Peter não me questionou.

            - Vamos ver quem encontra primeiro. – O cara respondeu.



            A próxima parada foi o presídio onde conversamos com a chefia e a única detenta com quem Rachel manteve contato. Ela nos disse coisas obvias como o quanto ela é inteligente e rápida de raciocínio. Também nos esclareceu a razão dela ter sido mais violenta com Mark.

            - Ela torrou ele na arma de choque? Bem feito...todas aqui vão adorar saber. Ele adora fazer isso com a gente e abusa sempre que tem que levar alguma detenta pra fora do presídio. No mínimo ele quis...revistar ela...se é que me entende, e levou o que merecia. – Disse Susan, que parecia gostar de Rachel.

            - Pode provar o que está dizendo? – Peter questionou.

            - É claro que não. E ninguém está interessado no que se passa por aqui. Querem que eu diga se Rachel me falou que ia escapar?

            - Também...mas vamos começar pelos problemas de saúde dela. Rachel realmente passava mal?

            - Sim. Eu a ouvi vomitando...não conseguia comer nada. Disse pra ela pedir ajuda, um médico. Ela disse que sabia muito bem o que tinha. E que não precisava de médico.

            - Então ela já sabia que estava doente... – Pensei em voz alta.

            - NEAL! – Peter me tirou do devaneio. – Ela não precisava de médico porque estava forçando o vômito. É nisso que eu aposto.

            - Apostou mal meu chapa! – Disse Susan. – Eu diria que ela tem algo bem comum...e interessante.

            - Também é enfermeira? – Peter não tinha paciência nenhuma mais.

            - Não! Mas já tenho alguns anos aqui e ela não vai ser a primeira nem a ultima a vir para o presídio assim.

            - Ok, ok...voltando ao relato. Você acabou convencendo ela a pedir um médico?

            - Não exatamente. Depois de passar a noite vomitando e não querer tomar café ela foi fiando mais fraca. O almoço ela engoliu, mas logo passou mal. Durante a noite encontraram ela desmaiada na cela. Ela não concordou em ir e odiou que a obrigaram a fazer uns exames.

            - Por quê?

            - Porque dizia já saber o que tinha...e que por isso mesmo tinha que dar o fora daqui.

            - Eieieie ela disse pra você que iria fugir?

            - Não! Ela deu a entender que tentaria. Se eu achasse que ela realmente conseguiria, teria ido junto. – Com um sorriso tranquilo Susan deixou claro que não ia falar mais.

            - E hoje? O que houve?

            - Ela tornou a passar mal. Só que dessa vez ela pediu o atendimento médico.

            - Já tinha o plano armado. – Ele encerrou a conversa e dispensou a detenta.

           

            Fomos ver a cela e não tinha nada a não ser uma muda de roupa. Ali não conseguiríamos nada.



           

            - Ela não colocou aqui nenhum objeto pessoal. Temos de conferir se recebeu visitas e quem foi. Alguém pode tê-la ajudado



            Com isso me dei conta de que poderia ser acusado de tentar ajudar minha ex namorada. Eu estive ali e com minha fixa corrida nada limpa...melhor falar antes que Peter descubra.

            - Peter eu preciso te dizer que...

            - Que esteve aqui no dia seguinte ao que Rachel foi hospitalizada. – Ele me encarou e colocou a mão em meu ombro. – Eu sei. Eu conferi os registros da tornozeleira.

            - Mas...

            - Eu faço isso quase diariamente, Neal. – Ele me deu as costas. – Não acho que você seja louco o suficiente para ajudar na fuga de uma mulher que te fez de fantoche e ainda te deu um tiro.

            A equipe de campo estava tentando procurar imagens nas câmeras de segurança de ruas e praças, mas a verdade é que Rachel já estava muito longe e a polícia não fazia ideia do que fazer. Ela era realmente boa e deu um nó na cabeça do FBI. Mozzie me ligou...no fundo ele estava torcendo por ela.

            - Nunca pelos engravatados! – Disse ele.

            Eu já estava louco para voltar para casa e tentar esquecer Rachel pelo menos até amanhã pela manhã. Mas não permitiram. O juiz autorizou que os exames feitos pela detenta fossem recolhidos e tivemos que retornar ao hospital. 

Já era noite e estávamos exaustos. A enfermeira nos entregou sem nenhuma vontade de fazê-lo. Peter olhou as folhas e não entendeu nada, obviamente.

            - O que há de anormal aqui? Me explique. – Eu estava decidido a ouvir calado. Não iria me envolver nisso.

            - Anormal? Nada é anormal aqui. – Ela respondeu.

            - Mas, enfermeira Vivian Sanford, a Senhora me garantiu que os exames esclareciam o que ela tem.

            - Sim. São muito esclarecedores. Mas o que a paciente tem e que causa os sintomas não é nada anormal.

            - Como assim? – Peter olhava para as várias páginas com números e termos médicos.

            - Me permita? – Ela pegou os exames e separou uma única folha. Apontou com uma unha longa e vermelha a palavra POSITIVO. – Aqui está a resposta.

            - Positivo para o que? – Peter questionou.

            - A paciente está grávida, o que torna náuseas e desmaios muito comuns.



            Peter me olhou sem dizer nada. Eu também fico calado, não tinha voz naquele momento. Só a possibilidade de Rebecca...Rachel estar fugindo por aí com um bebê que pode ser meu na barriga já é aterrorizante.

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